quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Keep smiling!...

Keep smiling

(20130921 @ Jardim da Estrela)

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Ao(s) Jorge(s)!

Por sorte tivemos a oportunidade de visitar o Mercado Central... à procura das raízes humanas tantas vezes dispostas nestes centros económicos das cidades. No mercado havia de tudo, abundando vegetais, sementes, castanha (de cajú), malaguetas e outras especiarias ou iguarias.

Mas não foi a comida que me chamou a atenção. Foram os olhos pretos, pequenos e rasgados do Jaime, um reguila de quatro anos, que me abraçou com um sorriso contagiante e que deu à máquina fotográfica um minuto de atenção. O Jaime sorriu, brincou comigo, e depois correu - fiquei na dúvida se era suposto correr atrás dele e brincar à apanhada...



Acabei por ficar onde estava e deixei-o correr entre os corredores do mercado, percebendo que ele os conhecia de cor, de tantos passos lá dados. Virei-me para o lado e vi outro trio, mais velho, mais "duro", mais batido pela vida de menino de rua. O da esquerda, apresentava-se possante e confiante, marcando claramente o espaço territorial que sem discutir lhe reservei, conservando a distância que me permitia interagir com ele sem o ofender, sem o perturbar. À direita, debaixo de um boné de pala, um olho espreitou e, quando provocado, sorriu, envergonhado, ainda escondendo o resto de si.

Sobrou o Jorge, deitado, meigo, descalço, estranhamente feliz, indiferente ao cenário envolvente e às amarguras da vida. O Jorge, protegido pelo seu irmão mais velho - à esquerda - pouco falava português, recebendo várias traduções do irmão para responder às minhas perguntas.



Comecei pelo nome, apresentei-me e estendi a mão. Reparei em alguma surpresa, alguma impreparação para este acto aparentemente raro ou desconhecido; mas o aperto lá ocorreu. Perguntei-lhe porque não tinha sapatos e o sorriso fugiu, dando lugar à tristeza mais sincera que vi nos últimos tempos - tinham-lhe roubado os chinelos, afirmou, escondendo-se com vergonha no silêncio. Sem dramatizar disse "grande azar, pá" e perguntei-lhe "quanto custam uns chinelos?". Abrindo uma brecha no silêncio ele respondeu-me baixinho "cinquenta meticais".

Perdi-me no tempo, repetindo vezes sem conta um cálculo básico e elementar: "50 MTS a dividir por quarenta dá 1.25 EUR - não!, não pode ser! 50 MTS a dividir por quarenta...". Sim, apercebi-me da monumental insanidade daquele momento e de como alguns problemas são simples de resolver. Distanciei-me, aproveitando que alguém me chamara, vasculhei as moedas nos bolsos e vi 70 MTS por lá esquecidos, cunhados com 5 e com 10. Regressei em direcção ao Jorge, debrucei-me sobre ele e disse-lhe "aqui tens!, cinquenta meticais para comprares uns chinelos!", enquanto lhe passava as quatro moedas de dez e duas moedas de cinco. O Jorge, meio incrédulo, contou o dinheiro e, para meu espanto, não sorriu - olhou para mim e num português atrapalhado mostrou-me uma moeda de dois meticais, no lugar da moeda de cinco que julguei ter-lhe dado. Troquei a moeda de dois por uma de cinco e, enquanto dizia "que tonto que sou!", vi o Jorge levantar-se do chão e voar para fora do mercado. "Nunca mais o vejo", pensei com pena.

Distribui as moedas sobrantes pelos restantes miúdos, deixando ao pequeno Jaime a moeda de dois meticais, pensendo que sendo o mais novo não reparia ou não daria importância - e funcionou. Voltei ao centro do mercado e com uma sensação de satisfação pelo Jorge e de profunda convulsão emocional pela forma tão simples - e barata - de melhorar a vida de uma criança, perdi-me em divagações evasivas enquanto os meus olhos se perdiam nas pessoas e nas coisas.

Peixeiras...


... nas bancas de sementes e frutos ...



... nas vendoras distraídas ...



... e nos legumes cansados de não serem comprados.



Nisto, o Jorge e o irmão surgem a correr na minha direcção. O Jorge agarra-me na mão e diz-me "olha!" e sem perder um segundo baixei os olhos e vi-lhe os pés, afastados do chão frio e sujo, a flutuar sobre uns chinelos novos, imaculados, coloridos e quase tão brilhantes como os seus profundos olhos. Ele estava radiante, e o meu coração fez-lhe companhia, para que não passasse mais um momento só. O irmão (acho que não lhe cheguei a perguntar o nome), abraçado ao Jorge, protector e cúmplice, disse-me com postura de homem feito: "tu és gente boa!" e estendeu-me a mão. Senti-me pequeno ao pé daquele gigante, daquele lutador que descansou as rugas contraídas por saber o irmão melhor.

Deram-me outro aperto de mão e partiram, de regresso a uma vida que engana a tristeza e a miséria com sorrisos rasgados retirados não sei bem de onde. E nuns minutos roubados ao tempo, e com pouco, tão pouco, ganhei tanto, tanto mais do que dei!...

3-em-1

Hoje foi um dia cheio de actividades, de reuniões e de experiências. Como nos outros dias desta visita tivemos de passear a pé e de carro, e continuámos a ver gentes e situações surpreendentes.

Nas costas de uma carrinha de caixa aberta, vemos três ícones da Cidade de Maputo - um telemóvel (tanta gente com um...), um sorriso sincero e amigável, e as cores de Moçambique, vestidas, pintadas ou documentadas em outdoors gigantes numa qualquer parede da cidade.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Maputo by day

Ontem não tivemos tempo para ver a luz de Maputo. Hoje, para compensar, o despertador tocou às 6h45 - a recepção achou melhor ligar quinze minutos antes das 7h00 combinadas -, indo o Sol já bem alto, longe do horizonte que indica o oceano. O Sol nasce pelas 5h30 e combinei com ele um encontro para Sábado, por cima do azul do mar.

Acordámos no Southern Sun Maputo e, de malas não desfeitas, tomámos banho, descemos para o pequeno almoço (bem bom!) e despedimo-nos do simpático hotel para rumarmos ao Polana Serena Hotel, na Avenida Julius Nyerere, palco de alguma cultura tradicional.



Numa rápida tocata e fuga, deixámos as malas na recepção (o hotel estava cheio e o check-in só poderia ser feito a partir das 14h00) e fomos para a primeira das muitas reuniões do dia, na Baixa da cidade. À saída, o simpático porteiro deixou-se captar com todo o seu esplendor, toda a sua história, todas as suas histórias...



Já na zona baixa de Maputo, começamos a ver a Cidade como ela é, viva, dinâmica, cheia de movimento e de olhos atentos passagem de "tão distintas figuras".



Na Praça dos Trabalhadores, onde habita a estação dos CFM - Caminhos de Ferro de Moçambique -, o cenário era de agitação, num frenesim sem agitação nem confusão, mas ainda assim frenesim.



As cores de Moçambique tomam forma nas suas viaturas oficiais, os táxis e as motoretas (esqueci-me do nome local deste espectacular modo de transporte individual...).



Mas é nos autocarros - os chapas - que a maior parte das pessoas se desloca: sejam os oficiais, os semi-oficiais ou os assumidamente informais, eles gerem a mobilidade da população, com cuidados de segurança muitas vezes preocupantes... (não quero deixar de assinalar que o "pendura" do Mahindra é, certamente, um cidadão informado).



Na hora da refeição, ao meio-dia solar e do relógio, o cenário é de uma tranquilidade inquietante - comer na rua é normal, longe dos restaurantes inacessíveis à maioria / quase totalidade da população.



A comida pode vir de casa ou ser comprada no local, tirada quente de uma monumental e industrial panela para uma marmita descartável.



Outra opção é ir ao mercado, como o Mercado do Povo mesmo em frente do Conselho Nacional, onde se pode comer o prato que perfuma (intensamente) o ambiente.



Ainda no mercado, para quem prefere preparar comida em casa, há todo um manancial de elementos nutritivos, como malaguetas, camarões fritos e pó de amendoim.



A beleza desta terra é a simplicidade com que a vida acontece, aparentemente sem tabus, sem demasiada pressa, sem estresse...



No final de um dia de trabalho, em que visitámos as zonas mais saturadas de Maputo, conseguimos fazer um pequeno desvio para ver as obras e os artistas do Núcleo de Arte, onde o Kass Kass deixou-me captar a sua "fotografia pictórica" de uma feira semanal.



No final do dia, no final da luz solar, voltámos ao hotel, subimos para os quartos, descansámos uma hora (deu para tirar a roupa da mala e pendurar os tecidos vincados nos cabides) e voltámos a sair de gravata, rumo à casa do Sr. Embaixador, que gentilmente nos recebeu e nos acolheu, não só fisicamente mas ao projecto e parceria que viemos plantar.



O jantar passou a correr, fruto de tão boa conversa e companhia, e voltámos (de vez) ao hotel. A noite pediu mais um pouco da nossa companhia e, acedendo, ficámos a conversar nos sofás virados a Oriente, de novo a olhar para o Índico, comentando o dia e aproveitando o momento descontraído para .... descontrair.

Maputo, banhado pelo Índico!

Depois de quase onze horas encarcerado dentro de um avião, aterrámos em Maputo, uma tão distante cidade capital onde se fala um tão próximo Português. Ainda na manga entre o avião e o terminal, reparei numa placa que tinha as coordenadas do local... algo como 25° 58' S 32° 35' E, tão diferente das conhecidas e reconhecíveis 38°43′0″N 9°10′0″O da Cidade de Lisboa.

Já de noite, fomos recebidos no aeroporto com um caloroso sorriso do nosso anfitrião, esquecendo por momentos o corpo macerado da longa e incontornável viagem. Meio tontos, esperámos pelas malas de porão, igualmente nauseadas da viagem e das tantas voltas nos tapetes rolantes.

Em dois carros separados, nós os quatros e as malas acompanhantes fizemos uma curta viagem até ao Hotel Southern Sun Maputo, na Avenida da Marginal 4016, Maputo 4353 (antigo Holiday Inn). Depois de um curto
diálogo como empregado do Hotel, lá ganhámos a possibilidade de dormir no hotel, mesmo de depois de as nossas reservas terem sido anuladas por engano - ao encurtamos a estadia neste hotel a reserva foi totalmente anulada, sem conservação da primeira noite em Maputo. Lá se resolveu o assunto, ficando como única cicatriz a a separação dos quartos... três no segundo andar, bem distribuídos, e eu de vigia ao terceiro andar, sozinho.
Pelo caminho, entre a espera pelos novos quartos, falei para casa e falei contigo, Ana, e com os miúdos, ouvindo a doce voz do Henrique a perguntar porque é que não estava em casa, e o João a comentar, quase em tom de gozo, que os meus óculos escuros "perdidos" estavam na caixa do correio, onde "eu" os tinha guardado. (Apenas passaram doze horas, mas as saudades são já perceptíveis, marcadas e vincadas pelos quinze dias de férias que passámos juntos, próximos, em contínuo...)

Pousámos as malas nos quartos e rapidamente descemos para tomar um copo. Felizmente lembrei-me de me perfumar com repelente roll-on e de levar o micro boião de creme repelente que o hotel dispôs na casa de banho, ao lado do sabonete e do gel de banho - rapidamente o creme foi solicitado para que não fossemos jantar de ninguém. Somámos às bebidas - Coca-Cola Light para mim, se faz favor! - um prego sem manteiga que veio acompanhado de umas magníficas batatas fritas com a possibilidade de serem mergulhadas num molho de pimentos verdes moídos, levemente picante.

Hotel Southern Sun Maputo
Hotel Southern Sun Maputo (fonte: http://www.rhinoafrica.com)

Entre golos e dentadas, reparei na serenidade da última hora, como se, embora em trabalho, esta terra estivesse livre de pressão, de 'stress', como se aqui fosse mais fácil ser-se feliz. Não sei se é preconceito ou foi uma sensação autêntica, mas amanhã e depois terei a possibilidade de verificar. Ao fundo, encoberto pelas conversas que tivemos sobre as anteriores viagens de cada um e sobre os grandes objectivos da nossa presença em Maputo, ouvi uma voz, inesperada, rouca. Alguém me chamou a atenção - «é o Índico! Já tinha visto o Índico?».

E então apercebi-me da viagem que estava a fazer, conhecendo novas gentes, novas culturas, novas terras e um novo oceano!

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Eu sou pequenino, eu sou um gigante!...


Há seis anos atrás - mais hora, menos hora - estava a deitar-me como se fosse a primeira vez, como se nunca tivesse dormido, como se tivesse nascido assim, adulto. Peguei-te na mão, mínima, escondida entre as roupas que afinal estavam grandes, acariciei-te a pele e olhei-te sem pressa, sem noção do tempo, sem saber onde estávamos, se era dia ou noite. Nada fizeste; não olhaste para mim, não devolveste a carícia, não respiraste mais intensamente, mas também não o esperava. Só queria que soubesses que estava ali, pronto para ser teu, para sempre.

Dei-me, sem querer nada em troca. Senti, naquele ínfimo mas infinito momento, que tinha tudo o que se pode ter, que qualquer desejo seria ridículo comparado com o que tu me estavas a oferecer. Perdi-me em ti, tornei-me em "nós" de uma forma que ainda hoje me espanta e surpreende.
Hoje, mais habituado à felicidade que me vens trazendo, tenho a sorte de multiplicar essa sensação numa escala sem precedentes, partilhando a novidade e a descoberta de ser Pai com o teu irmão. Vejo-vos juntos, a brincar um com o outro ou simplesmente a partilhar as paredes enquanto viajam por terras diferentes, e sei que são Irmãos... não porque têm os mesmos Pai e Mãe mas porque se sentem mutuamente, preocupam-se, zelam pelo bem estar do outro muito antes de nós, Pais, repararmos que precisam de ajuda ou carinho.

Hoje, enquanto comemorávamos o teu sexto aniversário, no momento em que sopraste repetidamente a vela mágica, guardei-te embrulhado no meu abraço, aquele abraço que partilho apenas contigo. Pelo canto do olho vi a teu Mãe, segurando o teu irmão nos braços, pequeno, reguila, igualmente único e especial, igualmente feliz e mimado, mas tão, tão diferente de ti...

Hoje, seis anos depois de ser Pai, vejo em ti e no Henrique o melhor da Vida, sei o que posso e quero fazer. Quero ajudar-vos a escrever as linhas de um futuro que, embora incerto, será certamente marcado pela felicidade e pela alegria de ser vosso, de vocês serem meus, e de juntos, os quatro, sermos o "nós" que tão bem sabemos ser.

Este dia foi teu, mas como cada dia teu, foi também meu, da Mãe, do Mano e de todos os que têm a sorte de partilhar a Vida contigo!

Parabéns, João, por teres chegado tão longe em apenas seis anos, e te teres tornado um gigante na minha/nossa vida!

Pai!